sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Duas histórias reais

Duas histórias reais

Em primeiro lugar, devo dizer que da mesma forma que gosto de escrever, gosto também de ler. E como pesquisador, curioso, e eterno aprendiz das coisas do oculto e da espiritualidade, em especial no que diz respeito ás religiões afro.brasileiras, gosto de ler os trabalhos de outras pessoas, para tentar ver e entender pelas suas diferentes perspectivas, o modo como encaram o mundo espiritual. Como é bastante lógico, a verdade e o conhecimento não estão realmente nas mãos de ninguém, pois ninguém é seu dono (excepto o Criador).

Estas duas histórias que deixo aqui, foram retiradas e transcritas na integra de um livro que li á pouco tempo, que apesar de ser já bastante antigo, e com certeza já ter sido lido por muita gente, não deixa nunca de ser um bom livro. São dois factos reais, que servem como excelentes exemplos, daquilo, que em qualquer Centro espiritual e religioso, nunca deveria acontecer, mas infelizmente acontece, e continua a acontecer nos dias de hoje...

Passo então a transcrever, dois textos retirados do livro - “Curas, Mandingas e Feitiços de Preto-Velho” de António Alves Teixeira Neto - 5ª edição da Editora Eco - imprimido no Brasil:
  • Caso 1.

“- Desrespeito e indisciplina no Centro de Umbanda gera violenta confusão e acaba com o mesmo, uma inesperada chegada do nosso Caboclo Guaicuru salva a vida de um óptimo médium -

Na mesma época em que se deu o caso anterior, ou seja em 1966, e portanto quando ainda morávamos em Santa Luzia, fomos levados, pelo Cizenando, para visitar o Centro de Umbanda da já citada Ialorixá D.Amélia.
A bem da verdade, devemos dizer que, justamente desta vez, foi que conhecemos a Amélia e bem assim o seu Centro de Umbanda, que como já dissemos, era localizado em Guaxindiba.
Fomos, e lá chegando, nos colocámos um pouco retirados, ou mais exactamente, encostados a uma das paredes do Centro. Pedimos aliás, ao Cinzenando, que nada dissesse a quem quer que fosse, a respeito de quem éramos. Dissesse apenas, que lá tínhamos ido a seu convite, e simplesmente a fim de conhecer o Centro. Dessa forma, ali nos encontrávamos verdadeiramente incógnitos.
Logo de inicio, foi nos dado observar que, sentada ao lado do «peji», estava uma senhora cercada por diversos médiuns, todos eles devidamente paramentados, ou seja, com suas vestimentas de santo.
A tal senhora – mais tarde soubemos quem era ela, justamente a Ialorixá – ás gargalhadas, contava anedotas – por absurdo que possa parecer, e dai exactamente, as estardalhaçantes gargalhadas.
Era, lógica e indiscutivelmente, um enorme e inusitado desrespeito aos Orixás, ao próprio Centro, e bem assim, como á própia Umbanda, além de demonstrar o quanto de incompetência havia – perdoe-me ela por dizê-lo – por parte de quem, muito ao contrário, deveria ser a primeira entre todas as demais pessoas, a manter o respeito no ambiente, isto é, a Ialorixá. Nada porém, tínhamos com isso, e assim, limitamo-nos a constatar o que então acontecia e nada mais.
Como que para confirmar o juízo que havíamos já feito de tudo o que víamos, de repente, dirigindo-se á Ialorixá, uma de suas filhas-de-santo, jogando sua nunanga (roupa de santo) em cima dela, disse-lhe uma série de absurdos desaforos, proferindo, ao mesmo tempo, os mais «cabeludos palavrões». Era o fim, dissemos a nós mesmos. Mas...nada tínhamos com isso.
Foi quando, chegando ao clímax da inédita série de absurdos e erros que ali constatávamos, olhando exactamente para o centro do terreiro, vimos que, incorporado com o maravilhoso Caboclo Pena Verde, ali se encontrava um jovem, de uns seus quatorze para quinze anos – mais tarde soubemos que se chamava Jorge – que, naquele justo momento, dialogava – vamos assim dizer – com um homem alto, meio calvo (careca) e o diálogo, na realidade, nada mais era do que uma violenta «bronca» (desculpem-nos mais uma vez por usarmos de gíria), que o tal homem (era o amante da Ialorixá) estava dando no Guia do Jorge, pelo facto de estar ele, no afã de «desenvolver» a mediunidade de uma menina (de 10 anos na ocasião), fazendo-a rodar, rodar muito (é comum isso acontecer, malgrado nosso e graças aos parcos conhecimentos que têm ainda, muitos médiuns de Umbanda que conhecemos e temos encontrado em nossas andanças por vários terreiros, até mesmo no interior do pais, como no Rio Grande do Sul, por exemplo).
Eis que, de repente, virando-se para o tal homem, o nosso querido amigo Caboclo Pena Verde disse-lhe, mais ou menos o seguinte:
«Óia! Eu vai imbóra, mas vou levá o cavalo (o médium) comigo», e acto continuo, o jovem médium começou a cair no chão, praticamente morto, bem podemos dizer.
Era assim, o maior de todos os absurdos e erros que ali nos era dado verificar, e de nossa parte, logicamente, nada tínhamos ou devíamos fazer.
No entanto... «filho de Umbanda não tem querer», e justamente por isso, sem que de forma alguma pudéssemos evitar, o nosso Guia – Caboclo Guaicuru – se incorporou, e fazendo com que, para vergonha nossa, fôssemos para o meio do terreiro, e em voz alta e por demais autoritária, disse:

«Acende um toco (vela) no peji (altar) para o Anjo da Guarda do cavalo (médium). Canta o ponto do mano Pena Verde» (somos médium de incorporação também, no entanto, por demais consciente).
A seguir, dirigindo-se o nosso Guaicuru ao Caboclo Pena Verde, disse-lhe, mais ou menos o seguinte: «Dá maléme (perdão) mano, para o seu cavalo; ele não tem culpa de você ter sido ofendido pelo moço; castiga ele (o moço) mas não seu cavalo...».

Acenderam, conforme a ordem dada pelo nosso Guaicuru, a vela para o Anjo da Guarda do médium Jorge. O seu Pena Verde incorporou novamente e levantou o médium que já estava caído no chão. Por outro lado, violenta e indescritível confusão aconteceu no tal Centro, e assim logicamente, foi a sessão terminada de qualquer forma, sem que para isso, uma prece sequer, fosse proferida. Os médiuns, e a seu turno, os visitantes que ali se encontravam, cada um por si próprio, abandonaram o terreiro, e... «pernas, para que te queremos?!...».
Passaram-se desde então, uns poucos dias. Fomos, em nossa residência, novamente procurados pelo Cizenando, e desta feita, justamente para nos dizer, que o tal homem calvo, amante da Ialorixá, no dia seguinte àquele que tiveram lugar os factos aqui narrados por nós, tinha brigado seriamente com a amante – a Ialorixá Amélia – dando-lhe enorme e violenta surra de pau, quebrando-lhe por sinal, a cabeça, que na realidade, se apresentava com uma porção de riscas de «rachaduras». Fora dada parte á policia local, e assim estava ele, o agressor e desrespeitador do Caboclo Pena Verde, fugindo, pois que o estavam procurando para o prender. Por outro lado, como seria lógico e aceitável, o tal Centro de Umbanda de Guaxindiba, tinha acabado, mas acabado mesmo. E tudo isso, é claro, pelo desrespeito e indisciplina existentes. E que, para quem caiba a carapuça, possa servir de exemplo.”
  • Caso 2.

“- Um caso de feitura de santo, além de malfeito, é prejudicial á pobre criatura atingida -

Em tudo o que temos escrito, seja em livros, seja em jornais; em tudo o que temos dito nas vezes em que actuamos na televisão ou no rádio; nas gravações, inclusive para uma de Madrid, que fizemos para algumas emissoras de televisão; nas reportagens que tem sido feitas connosco, jamais deixamos de nos referir ao facto de que, infelizmente, a nossa Umbanda está cheia de indivíduos inescrupulosos, verdadeiros marginais, e pior ainda, verdadeiros ignorantes de tão delicado assunto, os quais, com o que fazem, visam antes de qualquer coisa, ao recebimento de dinheiro, aos beneficios que possam receber em proveito próprio, mas, por tal atitude, prejudicam, sob vários aspectos, as pessoas que a eles recorrem e que se servem dos seus «vastos conhecimentos». Sabemos, é obvio, a razão de ser de tudo isto, no entanto guardamo-la para nós mesmos, de vez que, para acabar com tal insensatez, teríamos de mexer (permitam-nos a gíria) com pessoas que, embora não possamos considerá-las como amigas, não lhes podemos dar sequer, o titulo de inimigas nossas. É assunto por demais sério e importante e que, de modo algum, caberia ser tratado neste livro.
Assim, limitamo-nos, na totalidade das vezes, a procurar, por todos os meios e modos, solucionar os casos que nos chegam ás mãos, em quantidade assaz considerável, como é, por exemplo, o que a seguir passamos a relatar.

De uma cidade do Estado do Rio Grande do Sul, datada de 3 de Maio de 1978, recebemos a seguinte carta:

«....., 3 de Maio de 1978
Prezado Professor António Alva.

Há alguns dias havíamos lhe escrito uma carta, mas que infelizmente até ao momento ainda não recebemos a resposta, não sabemos se há demora na resposta ou se ela foi extraviada antes de chegar ás suas mãos.
Novamente, voltamos a lhe dirigir algum pedido, o qual, já haviamos feito anteriormente.
Minha esposa....., nascida em 26 de Junho de 1943, do signo Câncer, desejaria do senhor uma consulta do seguinte assunto:

Ela é médium, andou fazendo o Santo em Porto Alegre, com um pai-de-santo, para a linha do Candomblé, o qual lhe botou sangue na cabeça, mas, não sabemos porque tudo anda errado, pois nada tem dado certo, agora resolveu mudar de pai-de-santo, para a linha de Umbanda, os santos estão todos juntos, comida não fazemos mais, porque o outro disse que não fizéssemos mais a comida; aos de Umbanda só acendemos velas (vermelha, amarela e branca), mudamos a água das quartinhas a cada 3 dias, o ebô (só é feito aos de Umbanda).
Agora também está jogando cartas, mas parou tudo de uma semana para cá, sempre estamos em choque um com o outro.
Gostaríamos que o senhor nos desse alguma orientação, meu signo é de Gêmeos, nascido em 15 de Junho.
Qualquer resposta, queira por favor remeter a .....

Atenciosamente.
(segue-se a assinatura).»

Em resposta á carta acima, endereçamos ao seu signatário a seguinte:

«Rio de Janeiro, 15 de Maio de 1978
Estimado irmão em OXALÁ,
.....

É bem possível que eu tenha recebido carta anterior de sua parte, no entanto, por se tratar de assunto que não poderá ser resolvido assim sem mais aquela, por uma simples carta ou muitas, mesmo que seja, naturalmente ou não respondi ou deixei-a entre as que não costumo, justamente por isso, responder. Peço que me desculpe.
Contudo, dada a sua insistência, permito-me acusar o recebimento, na sexta-feira passada, 12 do corrente mês, á qual dispensei minha maior atenção.
S/Esposa – D. .....: Tudo o que foi feito e tem sido feito, quanto ao Santo de sua esposa, tem sido, apenas e tão-somente, um rosário enorme e absurdo de erros, e pior ainda, de coisas que, se tal aconteceu, poderão acarretar males de vulto, mas de vulto mesmo, contra ela, contra o própio irmão, e contra até sua família e seus negócios. Infelizmente a nossa querida Umbanda está cheia de pessoas sem critério e sem conhecimentos básicos indispensáveis que, aos montões, andam por ai a fazer os maiores disparates e a causar aos que as procuram, uma série inenarrável de prejuízos. Mesmo porque, de um modo geral, cobram tais criaturas os olhos da cara para «fazer o Santo», como se costuma dizer.
Toda a criatura humana é médium, e existem cerca de 123 espécies diferentes de mediunidade. No entanto, a quase totalidade dos chamados «pais de santo», desconhece isto e vive a dizer, entre outras coisas: «você é médium; deve se desenvolver; deve fazer o santo o quanto antes», e assim por diante. Bom é quando apenas acontece coisa de pouca monta, relativamente. E quando, por exemplo, acontece que um pai-de-santo desencaminha uma senhora para a prostituição ou, pelo menos, para o adultério?!
Para sua esposa, teriam de ser feitos, com a presença dela aqui no Rio (com a sua, é lógico, acompanhando-a), uma série de trabalhos e isto não poderá, de modo algum, ser feito por correspondência.
Vocês teriam de vir ao Rio, e então, eu faria o que se tornasse necessário, inclusive encaminhando-os a um centro de Umbanda, que verdadeiramente pode ter esse nome e usá-lo correctamente.
Não obstante, eu poderia orientá-los, no máximo possível, por correspondência. O resultado seria bom, é claro porém, não seria o que na realidade, se deverá obter em assunto de tal seriedade.
No que desejar fazer, escreva-me para o seguinte endereço:

António Alves Teixeira (neto)
Rua .....

António De Alva, é apenas meu pseudónimo como escritor, jornalista, e radialista que sou. Meu verdadeiro nome é: António Alves Teixeira (neto).

Atenciosamente.
António Alves Teixeira (neto)»

Ao redigirmos as presentes linhas, relacionadas, como se vê, a esse novo caso, não tínhamos ainda recebido resposta, á carta que nós endereçamos ao irmão que nos escrevera sobre a feitura de Santo e outros problemas da esposa.
No entanto, como supomos, se trata de pessoas de certo recurso, como se costuma dizer; esperamos que venham esses nossos irmãos á nossa procura, visto que quanto ao que fez, além de absurdamente errado, é prejudicial ao Santo da moça. O que deve ser feito é, de um modo geral, o seguinte:
  • A uma cachoeira, levaremos o casal, e com a esposa, antes de tudo, faremos o seguinte:
    ao pé da pedreira, acenderemos uma vela para Xangô e outra para Oxum, pedindo a esses Orixás protecção e licença para o que teremos de fazer; abriremos uma garrafa de cerveja preta, e salvaremos Xangô, lançando sobre a pedreira a cerveja, em homenagem aquele Orixá;
  • em uma das margens do rio que pertença á cachoeira, acenderemos uma vela preta-vermelha para o Exu dos Rios (Nesbiros), e pedimos a ele também, licença para fazer o trabalho;
  • a seguir, cantando «pontos» para Xangô (Orixá da justiça) e para Oxum (Orixá do ouro), lavaremos com a água da cachoeira, a cabeça da irmã que foi ludibriada e prejudicada, com o que lhe foi feito anteriormente.


Isto feito, iremos para o interior de um centro de Umbanda, cujos componentes são nossos amigos, e antes de mais, têm de facto conhecimento do assunto, e lá então, faremos o seguinte:


Cruzamento

Com pemba branca, faremos inicialmente, sete cruzes, isto é, cruzaremos a moça como se segue:
  • uma cruz na testa – para permitir que a moça, no caso, seja uma iniciada ou, em outras palavras, esteja sendo iniciada, verdadeira e correctamente, na Umbanda; tenha somente bons pensamentos, evitando assim, os maus;
  • uma cruz na nuca – para permitir melhor actuação das entidades ou espíritos, para que, como protectores, guias, Orixás, etc., encontrem mais e maior facilidade do trabalhar com a moça («inicianda»);
  • uma cruz na parte superior do peito esquerdo (perto do pescoço) – esta terceira cruz, tem por finalidade fazer com que a «inicianda» adquira apenas bons sentimentos, isto é, que não tenha inveja, ciúme, etc.;
  • uma cruz em cima de cada pé (esquerdo e direito) – estas quarta e quinta cruzes são, justamente, para que a «inicianda» somente possa dar bons passos, ou seja, siga sempre o caminho do bem, o caminho guiado pelo ensinamento maravilhoso de nosso Pai Oxalá: «Amai a Deus sobre todas as coisas e, ao próximo, como a vós mesmos»;
  • uma cruz nas costas de cada mão (esquerda e direita) – estas duas cruzes são as que permitirão á «inicianda» que suas mãos somente sejam empregadas para o cumprimento ou execução de boas acções ou, em outras palavras, que a «inicianda» pratique, apenas boas acções.


A seguir, com «cera de Ory», faremos mais sete cruzes nos mesmos lugares onde foram feitas as cruzes com a pemba branca, e com as mesmas finalidades.
Note-se que, durante o tempo em que se estiver fazendo o cruzamento com pemba branca e com «cera de Ory», deverá ser cantado o seguinte e por demais conhecido ponto:


«Encruza, encruza, encruza este filho de Umbanda!...Encruza, encruza, encruza na lei de Umbanda, encruza!...


Este ponto também poderá ser cantado com algumas variações, tais como a invocação seguida de todos os Orixás da Umbanda, um após outro, e desta forma, ter-se-á:


« Encruza, encruza, encruza este filho de Umbanda!...Encruza, encruza, encruza, na fé de Olorum, encruza!...Encruza, encruza, encruza este filho de Umbanda!...Encruza, encruza, encruza, na fé de Oxalá, encruza!...
Encruza, encruza, encruza este filho de Umbanda!...Encruza, encruza, encruza, na fé de Xangô, encruza!...»


e assim por diante, nomeando-se, um a um, os sete grandes Orixás da nossa querida Umbanda.
Isto feito, estará a moça, ou seja, a «inicianda», devidamente «cruzada», passando-se então, para o baptismo.


Baptismo


Na Umbanda, em razão da enorme quantidade de centros, assim como pelo facto de, em cada um deles, ser praticado o ritual, na sua totalidade, de acordo com a orientação dos «guias espirituais» (como eles dizem, todavia, na verdade, o que se observa é, sem qualquer sombra de duvida, a vontade e a orientação do médium ou Chefe), o baptismo, e, de modo geral, todas as práticas variam enormemente. Não há, vamos assim dizer, dois ou mais terreiros que ajam de forma idêntica, mesmo em se tratando de terreiros subordinados ou filiados ás entidades associativas existentes. Infelizmente, é o que de facto acontece, a bem da verdade.
Para nós, porém, o baptismo (pois é dele que estamos tratando), será da maneira seguinte, em relação á moça de que estamos nos ocupando, isto é, a nossa «inicianda»:

  • para o centro do terreiro, chamaremos a moça (a «inicianda»),e ao lado dela, colocaremos os padrinhos;
  • isto feito, diremos na qualidade de celebrante ou executante, a todos os presentes, e de um modo muito especial, aos padrinhos e á própria aprendiz, da responsabilidade que em verdade estão assumindo (a «inicianda», quanto aos padrinhos, e estes quanto á «inicianda»), esclarecendo que, por falta dos verdadeiros pais da moça, serão os padrinhos que na realidade agirão como tais, em tudo, e por tudo;
  • em seguida (no caso, nós mesmos), faremos (o celebrante) uma prece a Deus, pela qual lhe pediremos que seja a «inicianda», pela cerimónia então realizada, verdadeiramente baptizada (é importante se notar que, no Candomblé, embora por ocasião de sair a filha ou filho-de-santo roncó – que é o que se chama de «saída de Iaô») se canta para que o Orixá dê o seu nome e, de um modo geral, se identifique. Isto feito, diremos então, mais ou menos o seguinte: «fulana, ou fulano» está baptizado em nome de Olorum (ou Zâmbi), de Oxalá e de todos os Orixás da Umbanda e, de agora em diante, será verdadeiramente uma umbandista!...

Após o «Cruzamento» e o Baptismo, iremos cogitar do «Amaci» que, para boa compreensão dos nossos irmãos e estimados leitores, será por nós detalhado, ao máximo possível, como se segue.


Amaci


«Amaci», é nada mais, do que uma lavagem de cabeça que se faz com a finalidade primacial de, justamente, fortalecer a cabeça do médium e, desta forma, poder ele estar de facto, em condições de trabalhar certo e a inteiro contento, podendo mesmo, com o correr de certo tempo, vir a ter o seu próprio terreiro, como de facto deverá sê-lo.
O «amaci» (lavagem de cabeça) é constituído pelo suco de várias ervas, as quais devem ser pisadas e depois espremidas fortemente, deixando escorrer o primeiro suco, o qual é grosso. Para isso, logicamente, ter-se-á que adicionar um pouco de água. As ervas comumente empregadas no preparo dos amacis são as seguintes: erva de São João, erva de Santa Bárbara, arruda, espada de São Jorge, erva de São Jerónimo, guiné pipiu, alecrim do campo, alecrim de jardim, barba de velho, folhas verdes de fumo, e também as ervas que, porventura, tenham sido indicadas pelo Guia Chefe do terreiro em certos casos.
No caso da nossa «inicianda», já teremos preparado o «amaci» e, então, diante do nosso peji (altar), faremos com que a moça se ajoelhe; colocamos sobre seus ombros uma tolha branca (ojá) e, no chão, uma bacia (de preferência de ágata e da cor branca); isto feito, despejaremos sobre a cabeça da moça o «amaci». Enquanto tal for feito, serão cantados pontos apropriados (costumamos fazer baptizados ou «amacis», e muito mais em nossa Umbanda, sem pontos cantados ou riscados. É coisa nossa, de nossa inteira responsabilidade, portanto).
Depois do «amaci», estará a nossa «inicianda» preparada para, correctamente certa, entrar, digamos assim, no terreiro, para adestrar suas mediunidades.
No caso especial de se tratar de mediunidade de incorporação – por sinal a que praticamente é mais conhecida e explorada – ainda se tornará necessário á nossa «inicianda» ser-lhe feito: «Confirmação» e «Coroação».


Confirmação


A seguir, com o máximo possível de detalhes, explicaremos o que é a «confirmação», para em seguida tratarmos da «coroação».
Esta cerimónia, também pertencente á «iniciação» do médium, em verdade só se torna necessária no caso de se tratar de médiuns de incorporação; no entanto, com a devida adaptação, servirá ela, logicamente, para qualquer tipo de mediunidade, muitos por sinal, já constatados.
Para a devida compreensão de nossos estimados irmãos e leitores, diremos que a «confirmação» é, sem duvida nenhuma, uma espécie de exame que se faz no médium, a fim de saber qual é o seu «chefe» ou «dono de cabeça», ou em outras palavras, qual é o seu «Guia», quais são as entidades (pelo menos a de «frente») que com ele trabalharão.
Desta forma, para se obter a confirmação ou, em outras e mais adequadas palavras, para se «confirmar» o médium (em nosso caso a moça de que estamos tratando), ter-se-á de fazer o que se segue:

  • 1 - depois de feito o «cruzamento», o «baptismo», e o «amaci», leva-se o médium para o terreiro;

  • 2 - chegando-se a esse ponto, uma de duas coisas se poderá fazer:

  • a) deixa-se o médium entre os demais, já preparados ou não, e, ao fazê-lo, passa-se a observar em que ponto (ou pontos) ele (o médium) começa a dar sinais de aproximação firme e visível da entidade;
  • b) pega-se o médium, individualmente, enquanto se manda o ogã (ou ogãs) que se puxa as «curimbas» cantar, um após outro, os pontos das diversas entidades que trabalham nos terreiros de Umbanda;

  • 3 - admitindo-se, por exemplo, que o médium se mostre mais influenciado por um ponto de Xangô, logicamente se terá de aceitar, que será da linha desse Orixá (Xangô) a entidade chefe ou dona de cabeça do médium, isto é, que irá vir «de frente» no médium;

  • 4 - isto acontecendo, insiste-se (não somente por uma vez, ou seja, numa primeira e única sessão ou «gira» a que o médium compareça, mas por algumas delas), até que, de modo mais satisfatório se verifique a incorporação;

  • 5 - percebendo-se então, que o médium (como se diz comumente) está incorporado, o chefe da sessão (também poderá ser um guia qualquer incorporado em outro médium, que esteja trabalhando com o médium) pedirá á entidade ali presente (incorporada no médium) que dê o seu ponto cantado, e também, que risque o seu ponto;

  • 6 - isto acontecendo, isto é, tendo a entidade recém incorporada na «inicianda» (é o nosso caso) riscado e cantado o seu ponto, poder-se-á dizer que o médium, de facto, é de incorporação, e que por outro lado, seu guia chefe será o caboclo tal, ou o preto-velho tal;

  • 7 - o médium, evidentemente continuará sendo observado sempre no terreiro, por quem de direito, a cada dia que passa e em cada novidade que com ele venha a ser constatada.


Não há na Umbanda, verdadeiramente, uma obediência fiel ao que estamos aqui ensinando; entretanto seria isso o que deveria ser feito, tendo em vista ser o correcto.

Coroação


Embora não seja isso observado na quase totalidade dos inúmeros terreiros de Umbanda já existentes, uma das partes mais importantes do preparo ou inicialização de um médium, é justamente, o que se chama de «coroação». Corresponderá , podemos dizer, ao «deká» que se dá no Candomblé, aos filhos-de-santo. Em outras palavras, é a «coroação» na Umbanda, uma como espécie de diplomação que se confere ao médium.
Ocorre a «coroação» quando, após o «cruzamento», o «baptismo», o «amaci», e a «confirmação», o médium é dado como em condições, vamos assim dizer, e levado ao centro do terreiro, quando então, é feita, com guiné, arruda, e espada de São Jorge, uma corôa, e colocada sobre a sua cabeça, e ao ser feito isto, é cantado por quem de direito ou de obrigação, o seguinte ponto:


«Coroa, coroa, este filho de Umbanda, coroa, coroa!...Coroa, coroa, na lei de Umbanda, coroa, coroa!...Coroa, coroa, para vencer demanda, coroa, coroa!...»


Terminada então a «coroação», estará o médium (no caso presente, a moça de quem estamos tratando) nas melhores condições possíveis, dentro da lei de Umbanda, para, até por si mesma, criar, fundar, e dirigir com acerto e dignidade, o seu próprio centro, casa, ou terreiro de Umbanda.
Já temos dito vezes sem conta, e o faremos sempre enquanto tivermos permissão do alto e a assistência constante e indispensável, posto que amiga e benfazeja, dos nossos guias, dos nossos Orixás, e, em suma, de todos os nossos inúmeros amigos da espiritualidade, entre eles, em destaque, os Exus e os Preto-Velhos, com quem, de mais perto trabalhamos, que a Umbanda, infelizmente ainda se encontra eivada de uma série enorme, e mais que tudo, absurda de falhas, erros, e o que é bem pior, de elementos inescrupulosos, além de incompetentes sob todos os pontos de vista.
Talvez por isso mesmo, que a nossa querida Umbanda ainda se encontra por demais misturada até com outras religiões, e até, a elas ligada, ou em outras palavras, que não obstante o tempo de sua existência em nossa terra, ainda não se desligou do «cordão umbilical», que no passado, a manteve como que presa e dependente de outros credos religiosos.
Sabemos é óbvio, o que se tornaria necessário para que tal fosse atacado, e aos poucos, consertado; no entanto, malgrado nosso, não é a nós que isso compete.
Há aos montões, federações, congregações, associações, e outras coisas mais, que, com o intuito de servir de cúpula á Umbanda, nada mais fazem do que oferecer pequeníssimos passos prol, daquilo que a bem da verdade, se poderia chamar de UMBANDA. Outros objectivos, outras finalidades, na realidade servem de meta a todos eles. Paciência! Mal nos comparando a Pilatos, diríamos por oportuno: «lavamos nossas mãos...»
Se tal não acontecesse, por certo, ao se entrar em qualquer terreiro de Umbanda, fosse ele aqui no Rio, em São Paulo, no Rio Grande do Sul, ou em qualquer outro Estado em que é actualmente dividido o nosso imenso e querido Brasil, sempre encontraríamos uma linha básica de orientação, uma uniformidade no ritual, nas suas mais comesinhas práticas.”

1 comentário:

Anónimo disse...

Paulo,

Meu email é: cjurema63@yahoo.com.br, escrevo de Salvador,Bahia, Brasil.
Sou filha de Oxum e gostei muito de seu blog.

abraços